segunda-feira, 24 de novembro de 2008

Difícil ser transparente?


  Às vezes, fico me perguntando porque é tão difícil ser transparente?
  Costumamos acreditar que ser transparente é simplesmente ser sincero, não enganar os outros.

  Mas ser transparente é muito mais do que isso.  É ter coragem de se expor, de ser frágil, de chorar, de falar do que a gente sente...

  Ser transparente é desnudar a alma, é deixar cair as máscaras, baixar as armas, destruir os imensos e grossos muros que nos empenhamos tanto para levantar...

  Ser transparente é permitir que toda a nossa doçura aflore, desabroche, transborde!

  Mas infelizmente, quase sempre, a maioria de nós decide não correr esse risco.

  Preferimos a dureza da razão à leveza que exporia toda a fragilidade humana.

  Preferimos o nó na garganta às lágrimas que brotam do mais profundo de nosso ser...

  Preferimos nos perder numa busca insana por respostas imediatas a simplesmente nos entregar e admitir que não sabemos, que temos medo!  Por mais doloroso que seja ter de construir uma máscara que nos distancia cada vez mais de quem realmente somos, preferimos assim: manter uma imagem que nos dê a sensação de proteção...

  E assim, vamos nos afogando mais e mais em falsas palavras, em falsas atitudes, em falsos sentimentos.

  Não porque sejamos pessoas mentirosas, mas apenas porque nos perdemos de nós mesmos e já não sabemos onde está nossa brandura, nosso amor mais intenso e não-contaminado.
  Com o passar dos anos, um vazio frio e escuro nos faz perceber que já não sabemos dar e nem pedir o que de mais precioso temos a compartilhar, doçura, compaixão...

  a compreensão de que todos nós sofremos, nos sentimos sós, imensamente tristes e choramos baixinho antes de dormir, num silêncio que nos remete a uma saudade desesperada de nós mesmos...

  daquilo que pulsa e grita dentro de nós, mas que não temos coragem de mostrar àqueles que mais amamos!
  Porque, infelizmente, aprendemos que é melhor revidar, descontar, agredir, acusar, criticar e julgar do que simplesmente dizer: você está me machucando...  pode parar, por favor?

  Porque aprendemos que dizer isso é ser fraco, é ser bobo, é ser menos do que o outro.

  Quando, na verdade, se agíssemos com o coração, poderíamos evitar tanta dor, tanta dor...

  Sugiro que deixemos explodir toda a nossa doçura!  Que consigamos não prender o choro, não conter a gargalhada, não esconder tanto o nosso medo, não desejar parecer tão invencível.

  Que consigamos não tentar controlar tanto, responder tanto, competir tanto que consigamos docemente viver... sentir, amar...  E que você seja não só razão, mas também coração, não só um escudo, mas também sentimento.
  Seja transparente, apesar de todo o risco que isso possa significar.

GLÁCIA DAIBERT 

LEVA-ME CONTIGO...



«LEVA-ME CONTIGO...

Leva-me contigo vida. Vamos fugir deste mapa cinzento e só regressar quando as cores da nossa vida se tocarem numa trincha larga e infinita que nos ligue eternamente.

Quero-me apaixonar por ti e que vivas em mim. Quero ser a infinidade contigo e caminhar com a simplicidade de uma mão dada, no caminho que ambos pintarmos.

Seremos artistas das quatro estações, nos quatro cantos redondos do mundo.

Leva-me contigo para um lugar qualquer, longe ou perto, onde existe um espelho mágico tão grande, que não tenha outra alternativa se não olhar-me nele, autodescobrir-me para além daquilo que os olhos se apercebem e, finalmente, encontrar-me comigo e com o amor. Pode ser aqui, ali ou acolá. Para norte, sul, este ou oeste. Para o calor de um deserto ou para o gelo do Árctico, para uma praia encantada de água azul cristalina ou para o interior de um castelo no cimo de uma montanha. Leva-me para esse sítio encantado, onde me possa libertar dos condicionamentos do tempo e das suas ilusões e aprenda a desligar a mente e a viver no único momento que é real, o presente. (…)

Acredito em ti como nunca acreditei e reconheço em mim uma máscara enferrujada, que preciso deitar fora, e um muro intransponível que preciso derrubar.

Ainda não sei o que é essa liberdade, mas conto contigo para me levares lá. Não me digas que não podemos ir e emite-me esse bilhete... peço-te. Sei que esperastes por mim todos estes anos, mas só agora estou pronto para derrotar os meus medos e entregar-me a ti.

Quero despojar-me do meu passado e renascer.

Leva-me vida e eu levo comigo apenas o necessário para os primeiros passos, pois sei que me providenciarás tudo o que necessito.

Ouvirei o rufar triunfante da minha respiração e o palpitar do meu instinto. Verei a sedução condutora da Natureza e, através dela do seu manto de luz, guiar-me-ei pelas estrelas, ventos e marés, até dar de caras comigo num lugar qualquer, onde o tempo não existe e as pessoas possam sorrir, simplesmente, por saberem que possuem o bem mais valioso de todos... TU.

Não sei se este lugar existe ou se o espelho mágico não passa de uma criação espontânea da minha cabeça, como sendo a única saída para enfrentar medos que tenho receio de perceber. Mas sei que só escrevendo esta carta é que posso ter hipótese de lá chegar e me encontrar, pois as palavras apontam para além daquilo que elas são, abrindo caminhos que só poderão ser percorridos, mais tarde, pela provação. E eu quero sentir esse sabor...

Leva-me contigo, só assim poderei renascer dentro do meu próprio coração e ter alma de pássaro. Só assim poderei sentir a sintonia e a unidade com alguém que possua uma alma esvoaçante do tamanho da minha e me ame da essência, nesta viagem tão misteriosa que é a autodescoberta.

Leva-me contigo da escuridão labiríntica à claridade, do medo ao amor, do constrangimento do tempo ao vazio da paz interior.

Leva-me contigo até às portas da felicidade.»

Gustavo Santos in Carta branca

quarta-feira, 19 de novembro de 2008

Como não ter Deus?!



Como não ter Deus?! Com Deus existindo, tudo dá esperança: sempre um milagre é possí­vel, o mundo se resolve. Mas, se não tem Deus, há-de a gente perdidos no vai-vem, e a vida é burra. É o aberto perigo das grandes e pequenas horas, não se podendo facilitar, é todos contra os acasos. Tendo Deus, é menos grave se descuidar um pouquinho, pois no fim dá certo.
Guimarães Rosa

Dizer



Dizer sim quando quero dizer não é dar mais valor aos outros do que a mim, é não colocar meus limites, e isso é não me respeitar.. É o mesmo que dizer que o que eu sinto não vale nada, que os ouros podem passar por cima de mim à vontade. E eles passam, sem dó nem piedade.
Hoje estou aprendendo a dizer não. Quando não quero alguma coisa, simplesmente digo não. Sem raiva nem emoção. Um não é só uma negativa. É nosso limite. Um direito que temos de decidir o que desejamos ou não fazer. A isso se dá o nome de dignidade. Quando nos colocamos com sinceridade, dizendo o que sentimos, somos respeitados.

Zíbia Gasparetto